domingo, 30 de junho de 2019

Há justificação para os valores astronómicos que estão a ser praticados nas transferencias de atletas ?


Estão a subir em exponencial, a um ritmo talvez nunca imaginado mesmo pelos mais afoitos, os valores pelos quais são negociados, não só alguns jogadores, os até agora chamados galáticos, mas um cada vez mais alargado leque de atletas, sobretudo no futebol.
Estão a tornar-se corriqueiros, quase desprestigiantes, as contratações por uns meros cinco, dez ou vinte milhões de euros. Agora, tudo que tem dois pés e acerta um chuto na bola, atinge facilmente valores acima dos oitenta ou cem milhões.
É sabido que o futebol é uma industria que movimenta e dá negócios e estimulo a muitas outras actividades. Da publicidade, aos equipamentos, á comunicação social, com relevo para as transmissões directas e programas de debate televisivo, ao negócio financeiro e bancário na gestão e movimentação dos fundos colossais envolvidos.
Daí resulta o argumento mais convincente que em geral é usado para justificar a prática destes valores astronómicos. Outro argumento, mas que já não colhe com a facildade de outrora, é que a carreira de futebolista é curta e de grande desgaste.
Mas, deixando a análise da razoabilidade destes e outros argumentos, paramos naquela que é a constatação e a pergunta aparentemente mais sensata de quem é confrontado para dar uma opinião : “mas, e isso incomoda-nos, incomoda alguém, fz mal a alguém? Então, isso é lá entre eles e se quem paga aceita pagar e quem recebe fica contente, seja com eles !”
Aparentemente assim seria. É lá com eles.
Mas, vejamos, a prática destes valores astronómicos, que começaram por ser apenas para um, dois ou meia duzia de casos com qualidade realmente muito acima dos outros, afectam de algum modo a vida de cada um de nós e dos cidadãos em geral ?
E a resposta, se bem que possa causar algum espanto, é, claramente que afectam.
Os recursos num dado momento á disposição da sociedade, do colectivo em geral, não são ilimitados. Se uma parte mais significativa for alocada a determinado fim, a determinado grupo ( ao futebol, neste caso) ou a determinada pessoa, não vão para os outros.
Mas, importante também é o facto de essa prática dos contratos e salários astronómicos levar a um clima psicológico que condiciona em muito o dia a dia de cada um pelo efeito na formação de preços em geral e de fortíssima desvalorização do dinheiro e, logo, nos preços, em termos gerais.
Assim, essa prática, pela desvalorização do valor do dinheiro, leva inquestionavelmente á desvalorização fortíssima do salário e do pecúlio, do aforro, de cada um.
Depois, forma-se um circulo vicioso que em muito agrava o que acabei de escrever e descrever. Os dirigentes do futebol e do desporto, a seguir, vão raciocinar e invocar que sendo eles a gerir os clubes que dão a ganahr a atletas e empresários valores tão elevados, tantos milhões, é natural e justo que eles ganhem também pelas mesmas bitolas. E, isso, agrava os efeitos negativos na qualidade de vida de cada um e do todo.
Talvez até mais importante, e é-o do ponto de vista do cumprimento das leis e da prevenção da criminalidade, há que ter em muita atenção a origem e o circuitos, os passos, do dinheiro.
É sabido que ao futebol e aos agentes desportivos estão muito associados os promotores e agentes imobiliários. Sector onde é mais facil e mais usado para a lavagem de dinheiro proveniente da corrupção e do crime organizado.
Portanto, numa primeira abordagem, mesmo sendo este um texto quase de resposta imediata, sem um estudo mais aprofundado do fenómeno relativamente recente da prática dos valores disparatados nos ordenados, nos contratos e transferências no mundo do futebol, o conselho ou a conclusão muito importante é que as entidades de regulação, fiscalização e supervisão a actuar neste domínio, deverão ter um papel cada vez mais activo e interveniente.
E também o impacto social. Grupos muito diminutos de pessoas isoladas de tudo e de todos, a viver em ilhas paramilitares em grandes cidades, bairros ou condomínios de isolamento afogados em luxo e riqueza, com segurança máxima, atolados no supérfluo e no desperdício.
Carlos Pereira Martins



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