Ainda há pouco olhava o ecrã do televisor e, numa parte dele passavam imagens de dois petroleiros em chamas, com rombos, com tripulações a ser evacuadas, um cenário de tragédia senão guerra. Na outra parte do ecrã, comentadores usavam as palavras, faziam trocadilhos, divertiam-se e faziam futurologia sobre as desgraças que dali poderiam advir para o mundo.
Enquanto isso, em cima das imagens dos petroleiros a arder, passavam já as cotações do crude que naturalmente haviam disparado. Os lucros e as perdas de quem, com a desgraça, vai fazendo fortuna.
Mas estas imagens são comuns em vários outros dias. Em cima da transmissão ao vivo de guerras em várias partes do mundo, os comentadores imunes a qualquer sentimento de compaixão, pena, amor pelos outros e com total falta de vergonha, fazem a sua parte no circo mediático.
Alguns canais de televisão, especializaram-se mesmo na transmissão da desgraça, do crime, do sangue e do horror que servem a cada minuto e tornam quem os segue imunes a qualquer sentimento de amor, sentir solidário, vergonha na cara e ausência de valores de cidadania.
Quase todos os canis e orgãos de comunicação escritos e falados divulgam e promovem debates e comentários sobre um novo fenómeno que nos invadiu, as fake news ou noticias falas, outrora tratadas como crime, perjúrio, hoje promovidas e banalizadas servindo os mais negros propósitos.
Se, no passado, as pessoas se preocupavam em mostrar sentimentos muito ligados aos valores religiosos, amiúde usando e abusando dessa beatice para efeito de montra e promoção pessoal, fazendo com isso esquecer e contrariar o que de mais negativo se lhes podeia atribuir, com a escola de indiferença e ausência de vergonha profusamente divulgada nos últimos anos pelos media, hoje em dia, a promoção pessoal e a moda colam á desumanização , á insensibilidade e à falta de vergonha.
São já situações diárias muito comuns as transmissões de desgraças, acidentes, incêndios, guerras, atentados e tragédias de toda a espécie em que, simultaneamente, aparecem informações em legendagem que nada ligam com o que está a ser noticiado. Muitas vezes são de sentido oposto no que se refere ás emoções que podem fazer sentir. Muitas vezes, em cima da tragédia, refere jogos de futebol, cinemas, programas a transmitir pelas televisões, uma completa falte da sensibilidade.
E, com esta "escola", as massas anónimas estão agora prontas, adequadas e aptas para elas próprias serem parte activa neste novo mundo da insensatez, do voyeurismo, do egoísmo, da promoção do umbigo próprio como expoente máximo do que possa ser importante para a humanidade, da maledicência e daquilo a que comumente e em linguagem rápida se apelida de cusquice e o denegrir o próximo.
Não consigo já fazer vaticínios sobre a evolução disto tudo, ao que isto nos poderá conduzir, nem valerá a pena.
A pena, vale, estou certo, denunciar, alertar, falar, escrever e contrariar.
Isso sim. E é por isso mesmo que o estou a fazer.
Há quem não goste? Pois bem, que coma menos. Também eu não gosto do que vejo, do rumo desta história e vou tendo que engolir.
Creio sinceramente que é possível dar a volta a esta situação. Até pelo facto de muitas pessoas que parece serem promotoras daquilo contra o qual me revolto, serem pessoas com qualidades, capazes de grandes coisas, com sentimentos nobres, boas. Vão é na onda da "moda", desta moda horrenda que nos invadiu. As reacções de grupo, os movimentos motivados pelas psicologias de grupo, são assim mesmo. E, tão facilmente quanto progrediram no sentido que considero negativo, são capazes de corrigir a marcha e inverter de rumo para o melhor dos sentidos.
Como a esperança deverá ser a ultima coisa a perder, tenhamos esperança. Mas não basta tê-la, é mesmo preciso militar por ela.
Carlos Pereira Martins
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