Sexta-feira à noite. Liguei o televisor para ver o jogo entre o Spoting e o Santa Clara, queria ver futebol e só isso.
Os comentários eram feitos por uma dupla de jornalistas com as vozes muito bem colocadas, palavras e sílabas bem pronunciadas, com timbre mesmo da chamada “gente fina”. Não os conheço para concluir para além da qualidade da pronúncia.
Até que um deles insitiu que o Sporting tinha era que COMprir com o que tinha que fazer, ganhar os três pontos. E nos momentos seguintes um apelidava um jogador leonino francês de Mathieu (â), e o outro, repetidamente, como se não tivesse ouvido sequer o primeiro, apelidava-o de “MatiÔ”. E este bate bolas repetiu-se algumas vezes. Aquilo, como se diz na Beira alta, buliu comigo !
Eu vinha já dos canais de noticias onde os erros grosseiros de português são tantos e tão graves que é de longe preferivel não ter noticias novas a ouvir o que e como o dizem.
E, nesses, há um especialmente dedicado ao sangue e à faca e alguidar que parece que recruta, expressamente, para ler noticias a metro, moças que não fazem a minima ideia do que seja entoação, da forma como deve ser lida uma frase, uma palavra, no contexto em que é dita e se pretende que seja entendida. Um horror.
Ou talvez seja gente recrutada a ganhar menos de metade do salario mínimo, razões de custos que, naturalmente, afectam a qualidade. A toada é tão fora do contexto, tão desajustada e ridicula, até, que levam a desligar o televisor.
A reacção perante os comentadores e a transmissão do jogo foi imediata, passei a ver o futebol sem som, tirei-lhes o discurso.
Afinal, vendo bem, há muitos anos não se viam os jogos em directo, ouvia-se mais tarde o resultado. Sorte tinha já eu em poder ver o jogo como no estádio, pensando e comentando com os meus botões, com o meu conhecimento e ignorância sobre o que ao futebol diz respeito, concordando ou não com as decisões do árbitro, gostando mais ou menos da técnica e das jogadas que aqueles vinte e dois artistas iam desenhando.
Mas uma interrogação, essa sim, muito mais séria e que me afligia o espírito, por não ter resposta fácil para ela, me ocorria. Mas então, para que ando eu a pagar a estes canais, que por sua vez pagam a estes comentadores e jornalistas mal formados, sem saber falar o português que sempre aprendeu e não esqueceu quem fez uma quarta classe bem feita?
Sim, e sobretudo porque tenho plena consciência, já o escrevi mesmo, que o excesso de informação que nos tempos que correm recebemos é prejudicial ao próprio conhecimento, á formação de opinião e assimilação de cultura ou conhecimentos.
Tudo nos é servido numa ansia vertiginosa de nos passar mais informação, toda a informção, não importa com que qualidade ou critério, apenas um, servir-nos primeiro do que o concorrente possa fazer.
Misturando o importante e fundamental com o superficial e mesmo desnecessário, o incendio (tantas vezes dito “ENcendio”) no terceiro andar com o atentado contra uma comunidade, uma cidade ou um país inteiro.
Então, não é a revolução da informação?
Será, é mesmo, não tenho a menor dúvida. E as apreciações valorativas, a preocupação com, pela informação, pelo maior conhecimento, formar melhores pessoas, melhores mentalidades e com isso tornar melhor a VIDA ?
Claro que a industria e os interesses que exploram a informação se estão nas tintas para Valores, formar pessoas e para a qualidade da VIDA futura. O retorno imediato é a única preocupação, ao que parece.
Pelo meio, surgem umas roupagens de “jornalismo de investigação”, com pele mais doce, cheiro mais sério mas que, no fundo, vai no mesmo caminho.
Porquê?
Porque nada disso é consequente, só excepcionalmente leva a qualquer responsabilização e consequências que se possam dizer “sérias”.
Toda esta quantidade de informação, misturada sem critérios valorativos, aos magotes, do supérfluo ao horror ou ao que é grave e determinante, leva à banalização dos horrores, do que é pior do que mau, impensável para mentes medianamente sãs e bem formadas. O efeito de quantidade sem apreciação valorativa, a mistura passando do crime de sangue para o resultado do jogo de futebol, tornam absolutamente banal qualquer desses horrores, produzem um efeito muito provável de imitação ou de irresponsabilidade em situações futuras.
Toda esta quantidade de informação sem ser valorada, não quero insinuar censurada mas medida nas suas consequências, levam a uma progressão desmesurada dos sentimentos de angustia, de desânimo, de revolta, de ansiedade, depressão e quebra da qualidade de saúde e de VIDA de todos os cidadãos.
E isto não pode durar sempre, agravar-se indefinidamente.
Haverá, então, que ter força para desligar o rádio ou o televisor?
Já passei a fazê-lo muitas vezes, talvez “A bem da Nação” e, sem duvida ,
“A bem de mim próprio”.
Calos Pereira Martins
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