sábado, 9 de março de 2013

Os leilões de Energia, os Consumidores e um negócio que não cheira nada bem !






Vivem-se tempos  em  que  se perderam  quase por completo valores essenciais  de  ética, de solidariedade, de cidadania,  de honestidade, enfim, os valores mínimos exigíveis a todos os seres humanos enquanto sejam seres vivos, de convivência  e relacionamento com todos os outros.

Isto  mesmo já foi por demais dito  e escrito mas  vem  agora  a este texto  depois  de  ter  ouvido  as  noticias  sobre  o referendo  votado  no  passado  fim  de semana na Suiça e pelo qual  a população eleitora  pretendeu  que  fossem  controlados  e colocado  um  tecto  máximo  aos  salários e aos prémios  atribuídos,  em  geral  pelos próprios,  aos  chamados  altos quadros  das  empresas.


Os  níveis  despudorados atingidos,  não só  na Suiça  como  na Europa,  nos EUA  e  em  geral  por todo  o mundo,  são  de  tal  monta  que  mais não  são  do  que  verdadeiros  roubos  ou  apropriação  “legal”,  já  que  não  infringirão  supostamente  qualquer  lei  proibitiva.


Curioso  e  extremamente  pertinente  foi  um  comentário  de  uma  cidadã  eleitora,  que  se  regozijava  com  a vitória  alcançada  em  todos  os Cantões helvéticos  mas  não  deixava  de  ser  realista  e  prudente   adiantando,  logo  em  seguida,  que  nada  do  que  se pretendia  com  o referendo  se  conseguirá  se  não  vier  a  ser  acompanhado  de  iguais  medidas  a  nível  internacional,  por  todos  ou  muitos  dos  outros  países.

E  adiantava  que  teria  que  haver  uma  concertação  internacional  pois  os  visados   apregoavam  já  que,  aplicando-se  a medida na Suiça,  estariam  já  de  malas aviadas  para  outras paragens  onde  o  despudor  pudesse  continuar.

Insurgia-se a cidadã  helvética pelo  facto  de  os cidadãos suiços  terem  investido  e pago  a formação  daquelas pessoas  e  verem  que  iriam  aplicar  o saber  adquirido  noutros países. É  muito  discutível  esta  preocupação,  no  caso  dos "saberes"  em  causa,  mas  compreende-se.
  

Este  raio  de  lucidez  e  de  realismo é,  na  verdade,  o  mesmo  que   se  passa  com  todas  as  medidas  já tomadas  e  as  que  possam ainda  vir  a ser tomadas  para  resolver  a  crise,   para  impedir  a  gula  especulativa  dos  chamados “Mercados”.


É  muito  curiosa  a experiência  que  a vida,  o passar  dos  anos  e  a  história  nos  traz.  Reparemos  que  estamos  a falar  da Suiça,  não  da  Roménia,  da Polónia ,  da Checoslováquia  ou  da própria  URSS  dos  tempos  comunistas.


Mas,  por  falar  em  Valores,  em  mínimos  de  convivência  social ,  de cidadania,  éticos ,  morais  e  profissionais,   não  deixarei  de  abordar  um  tema  que  me  chocou  profundamente,  ainda  durante  o  fim  de semana  -  a  enorme  campanha  desenvolvida  pela  organização  de defesa  dos  consumidores  em  Portugal,  propondo-se  prestar-lhes  um  grande serviço  encontrando  o  melhor  preço  entre  os vários  distribuidores de energia  ,  o  chamado  leilão  de  energia.

Vi  inicialmente  na  revista  do  Grupo  Deco,  a  Proteste.   A  seguir,  durante  uma  viagem  ao  norte,  ouvi  com  frequência  os  anúncios  na  rádio.

Quase  não  queria  acreditar  no  que  ouvia.

A  organização  dos  Consumidores  pretende,  ao  contrário  do  que  as  leis  da  concorrência   sempre  ensinaram  (haver  mais  do  que  uma  entidade  em  confronto,  no  dia  a dia,  para  poder  fazer  baixar  os  preços),  dar  a  volta  ao  texto  e,  com  o pretexto  de  encontrar  ela  um  melhor  preço,  concentrar  milhões  de  consumidores  incautos  num  único  fornecedor.

Tudo  isto  poderia até  parecer  correcto,  com  um  objectivo  claro  e  de defesa  dos  Consumidores.
Não  fora  as  coisas  andarem  realmente  tão  pouco  transparentes  pela área  das  energias,  em  Portugal. 


Foi  o Secretário  de Estado  que  ao  pretender  colocar  algumas  regras  sobre  a  pressão  das  distribuidoras  foi  corrido,  são  as  campanhas  para  mudar  de fornecedor  sobre  o pretexto  de se  tornar o mercado  mais  competitivo  e  os  preços mais baixos,  com  a  agravante de, aos  que  não  mudarem,  como  prémio  de fidelidade e permanência,  o  fornecedor actual  lhes  “SUBIR”  o  preço  que  pagam  agora...!


Mas,  com  esta  campanha  de  encontrar  o  melhor  preço  “em  leilão”,  a  organização  dos  nossos consumidores  pede-lhes ,  para  poder simular  a sua  futura factura,  que  lhe  forneçam   uma série  de dados  os  quais,  vistos  com  atenção,  permitirão  á Deco / Proteste  ficar  com  uma  enormíssima  base  de dados  de consumos médios,  preferências,  distribuidores utilizados,  etc,  etc.

Só  por  si,  uma  base  valiosíssima  para  ser  explorada  por  alguém  ou  cedida  ou  vendida.


Generosidade  absoluta,  o  facto  de  a  organização  dos  Consumidores  dispensar  de  qualquer  pagamento  de  comissões  para  entrar  no  leilão  a quem  seja  já  seu  associado.

Diz,  textualmente  a Proteste  que  " a DECO  poderá vir a receber uma  comissão  por cada contrato assinado pelos consumidores junto  do  fornecedor  que  ganhar o leilão"  e que,  a acontecer,  quererá   "privilegiar  os  associados, dado  que são  eles que nos financiam.  Assim,  só iremos reter o valor dos não associados."

Concluir-se- á  deste  texto  tão  pouco  claro na Proteste  que  a organização dos consumidores já terá  negociado  com  todos os fornecedores de ectricidade  as "comissões"  envolvidas neste negócio. Seja quem  for  que ganhe o leilão,  pagará comissões á DECO.  Depois,  esta,  reterá  a grande  maioria  das verbas  correspondentes aos  milhares de aderentes que não serão, obviamente,  seus associados. E,  dos actuais sócios,  fica a duvida,  a DECO  não  reterá. Então,  vai   devolver  aos Sócios?
Mas, quem  faz  os débitos, emite as facturas,  é  a distribuidora. . .
Vai  a DECO  ceder-lhes os seus ficheiros  , a base de dados dos seus associados?
Que  grande confusão !
Que  falta de clareza  e  transparência  para  quem  deve  primar  exactamente pelo  contrário.    

E,  não  cobra ou não retém  comissões relativamente aos seus já associados. Pudera,  entre  os  milhões  de  consumidores  que  possam  cair  na  campanha,  o  subconjunto  dos  que  sejam  já  sócios  da Deco  será  quase  residual.
Depois,  esse  proveito  a  que  diz  renunciar,  comparado  com  os  ganhos  que  só pela  base de dados,  se não  houver outras  comissões  ou  proveitos do  fornecedor de energia  que  ganhe  o  leilão  envolvidos,  tornam  ridícula  a  verba  dos  já  associados  da Deco.

Não  pretendo  fazer  juízos  antecipados  ou  infundados.
Mas,  que  tal  como  no  caso  do afastamento  do Secretário de estado,  dos preços  e agravamentos  para  quem  não  mude  de fornecedor,  este  leilão  cheira  a   grande  esturro,  lá  isso  cheira  mesmo.

Mas,  como  inicialmente  tive  o cuidado  de  salientar,  legal,  á  sombra  da  lei  que  existe  ou  é  omissa.

E  os  consumidores?
A  quem  podemos  reclamar,  pugnar  por  seriedade,  rectidão,  ética  e  rigor?

Á  organização  dos consumidores,  parece  que  não. Á Entidade Reguladora,  está  visto  que  muito  menos.
Á  Autoridade  da  Concorrência,  idem, idem, aspas.

Os  cidadãos  terão  que  tomar,  de facto,  os  seus  interesses,  a  ética  e  o  rigor  das  suas  coisas  nas  próprias  mãos.  Caso  contrário,  a  falta  de vergonha,  o negócio  pela  ganância,  o  despudor,  tomarão  conta  de  todos  nós.
E  há  que  ter  Esperança  e  acreditar  que  ainda  será  possível,  por  nós  próprios,   inverter  esta  podridão.

Se  há  de  facto  alguma  oportunidade  que  a  crise  nos  revelou  de novo,  diz-se  muito  que  as  crises  geram  novas  oportunidades  e desafios,  não  são  os  legítimos  e  aflitivos  desenrascas  que  levam  famílias inteiras  a  inventar negócios  de venda  de chupa  chupas  em  carrinhos de mão  como  no  chamado  “terceiro  mundo”.

A  verdadeira oportunidade foi  a  crise  ter  mostrado  claramente  que  a FORÇA  está  do  lado  dos Consumidores.
Há  já  exemplos  claros  dessa  força. Se grupos de consumidores deixarem  de comprar em determinados locais, marcas ou mesmo  produtos,  os  donos  do  mercado  mudam  obrigatoriamente de comportamentos.
Se os  consumidores de noticias deixarem  de ligar  certos  canais  abusivos de  televisão  onde a angustia é distribuída em doses enormes á hora das refeições,  por  forma  a  causar-lhes  sérios problemas de saúde e sociais,  eles irão  mudar  pois medem  as audiências  minuto  a minuto.

Assim  os  Consumidores  se  saibam  organizar  e  a  verdadeira oportunidade  desta  crise  estará  ao  alcance  para  a poder  mudar  de rumo.

Mas é necessária  determinação  e  uma  boa  liderança, claro.

  

Sem comentários:

Enviar um comentário