Vivem-se tempos em que se perderam quase por completo valores essenciais de ética, de solidariedade, de cidadania, de honestidade, enfim, os valores mínimos exigíveis a todos os seres humanos enquanto sejam seres vivos, de convivência e relacionamento com todos os outros.
Isto mesmo já foi por demais dito e escrito mas vem agora a este texto depois de ter ouvido as noticias sobre o referendo votado no passado fim de semana na Suiça e pelo qual a população eleitora pretendeu que fossem controlados e colocado um tecto máximo aos salários e aos prémios atribuídos, em geral pelos próprios, aos chamados altos quadros das empresas.
Os níveis despudorados atingidos, não só na Suiça como na Europa, nos EUA e em geral por todo o mundo, são de tal monta que mais não são do que verdadeiros roubos ou apropriação “legal”, já que não infringirão supostamente qualquer lei proibitiva.
Curioso e extremamente pertinente foi um comentário de uma cidadã eleitora, que se regozijava com a vitória alcançada em todos os Cantões helvéticos mas não deixava de ser realista e prudente adiantando, logo em seguida, que nada do que se pretendia com o referendo se conseguirá se não vier a ser acompanhado de iguais medidas a nível internacional, por todos ou muitos dos outros países.
E adiantava que teria que haver uma concertação internacional pois os visados apregoavam já que, aplicando-se a medida na Suiça, estariam já de malas aviadas para outras paragens onde o despudor pudesse continuar.
Insurgia-se a cidadã helvética pelo facto de os cidadãos suiços terem investido e pago a formação daquelas pessoas e verem que iriam aplicar o saber adquirido noutros países. É muito discutível esta preocupação, no caso dos "saberes" em causa, mas compreende-se.
Este raio de lucidez e de realismo é, na verdade, o mesmo que se passa com todas as medidas já tomadas e as que possam ainda vir a ser tomadas para resolver a crise, para impedir a gula especulativa dos chamados “Mercados”.
É muito curiosa a experiência que a vida, o passar dos anos e a história nos traz. Reparemos que estamos a falar da Suiça, não da Roménia, da Polónia , da Checoslováquia ou da própria URSS dos tempos comunistas.
Mas, por falar em Valores, em mínimos de convivência social , de cidadania, éticos , morais e profissionais, não deixarei de abordar um tema que me chocou profundamente, ainda durante o fim de semana - a enorme campanha desenvolvida pela organização de defesa dos consumidores em Portugal, propondo-se prestar-lhes um grande serviço encontrando o melhor preço entre os vários distribuidores de energia , o chamado leilão de energia.
Vi inicialmente na revista do Grupo Deco, a Proteste. A seguir, durante uma viagem ao norte, ouvi com frequência os anúncios na rádio.
Quase não queria acreditar no que ouvia.
A organização dos Consumidores pretende, ao contrário do que as leis da concorrência sempre ensinaram (haver mais do que uma entidade em confronto, no dia a dia, para poder fazer baixar os preços), dar a volta ao texto e, com o pretexto de encontrar ela um melhor preço, concentrar milhões de consumidores incautos num único fornecedor.
Tudo isto poderia até parecer correcto, com um objectivo claro e de defesa dos Consumidores.
Não fora as coisas andarem realmente tão pouco transparentes pela área das energias, em Portugal.
Foi o Secretário de Estado que ao pretender colocar algumas regras sobre a pressão das distribuidoras foi corrido, são as campanhas para mudar de fornecedor sobre o pretexto de se tornar o mercado mais competitivo e os preços mais baixos, com a agravante de, aos que não mudarem, como prémio de fidelidade e permanência, o fornecedor actual lhes “SUBIR” o preço que pagam agora...!
Mas, com esta campanha de encontrar o melhor preço “em leilão”, a organização dos nossos consumidores pede-lhes , para poder simular a sua futura factura, que lhe forneçam uma série de dados os quais, vistos com atenção, permitirão á Deco / Proteste ficar com uma enormíssima base de dados de consumos médios, preferências, distribuidores utilizados, etc, etc.
Só por si, uma base valiosíssima para ser explorada por alguém ou cedida ou vendida.
Generosidade absoluta, o facto de a organização dos Consumidores dispensar de qualquer pagamento de comissões para entrar no leilão a quem seja já seu associado.
Diz, textualmente a Proteste que " a DECO poderá vir a receber uma comissão por cada contrato assinado pelos consumidores junto do fornecedor que ganhar o leilão" e que, a acontecer, quererá "privilegiar os associados, dado que são eles que nos financiam. Assim, só iremos reter o valor dos não associados."
Concluir-se- á deste texto tão pouco claro na Proteste que a organização dos consumidores já terá negociado com todos os fornecedores de ectricidade as "comissões" envolvidas neste negócio. Seja quem for que ganhe o leilão, pagará comissões á DECO. Depois, esta, reterá a grande maioria das verbas correspondentes aos milhares de aderentes que não serão, obviamente, seus associados. E, dos actuais sócios, fica a duvida, a DECO não reterá. Então, vai devolver aos Sócios?
Mas, quem faz os débitos, emite as facturas, é a distribuidora. . .
Vai a DECO ceder-lhes os seus ficheiros , a base de dados dos seus associados?
Que grande confusão !
Que falta de clareza e transparência para quem deve primar exactamente pelo contrário.
Mas, quem faz os débitos, emite as facturas, é a distribuidora. . .
Vai a DECO ceder-lhes os seus ficheiros , a base de dados dos seus associados?
Que grande confusão !
Que falta de clareza e transparência para quem deve primar exactamente pelo contrário.
E, não cobra ou não retém comissões relativamente aos seus já associados. Pudera, entre os milhões de consumidores que possam cair na campanha, o subconjunto dos que sejam já sócios da Deco será quase residual.
Depois, esse proveito a que diz renunciar, comparado com os ganhos que só pela base de dados, se não houver outras comissões ou proveitos do fornecedor de energia que ganhe o leilão envolvidos, tornam ridícula a verba dos já associados da Deco.
Não pretendo fazer juízos antecipados ou infundados.
Mas, que tal como no caso do afastamento do Secretário de estado, dos preços e agravamentos para quem não mude de fornecedor, este leilão cheira a grande esturro, lá isso cheira mesmo.
Mas, como inicialmente tive o cuidado de salientar, legal, á sombra da lei que existe ou é omissa.
E os consumidores?
A quem podemos reclamar, pugnar por seriedade, rectidão, ética e rigor?
Á organização dos consumidores, parece que não. Á Entidade Reguladora, está visto que muito menos.
Á Autoridade da Concorrência, idem, idem, aspas.
Os cidadãos terão que tomar, de facto, os seus interesses, a ética e o rigor das suas coisas nas próprias mãos. Caso contrário, a falta de vergonha, o negócio pela ganância, o despudor, tomarão conta de todos nós.
E há que ter Esperança e acreditar que ainda será possível, por nós próprios, inverter esta podridão.
Se há de facto alguma oportunidade que a crise nos revelou de novo, diz-se muito que as crises geram novas oportunidades e desafios, não são os legítimos e aflitivos desenrascas que levam famílias inteiras a inventar negócios de venda de chupa chupas em carrinhos de mão como no chamado “terceiro mundo”.
A verdadeira oportunidade foi a crise ter mostrado claramente que a FORÇA está do lado dos Consumidores.
Há já exemplos claros dessa força. Se grupos de consumidores deixarem de comprar em determinados locais, marcas ou mesmo produtos, os donos do mercado mudam obrigatoriamente de comportamentos.
Se os consumidores de noticias deixarem de ligar certos canais abusivos de televisão onde a angustia é distribuída em doses enormes á hora das refeições, por forma a causar-lhes sérios problemas de saúde e sociais, eles irão mudar pois medem as audiências minuto a minuto.
Assim os Consumidores se saibam organizar e a verdadeira oportunidade desta crise estará ao alcance para a poder mudar de rumo.
Mas é necessária determinação e uma boa liderança, claro.
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