Há já alguns dias que fazia a barba com a maquina. Hoje, deu-me para variar, penso que fica melhor mas dá muito mais trabalho ou demoro mais tempo, fiz com a gilete.
Por demorar mais tempo, tenho oportunidade para ver no espelho quem estou a escanhoar e para pensar em coisas, no rosto que vejo, naquilo que lhe está associado e na vida em geral.
Mais coisa menos coisa, muda paradigma para cá, muda de paradigma para acolá, nunca tive duvidas quanto á forma de sociedade em que desejo viver e acabar o meu temo. Uma sociedade livre, democrática, socialmente equilibrada quanto á repartição da riqueza e dos meios de produção, o que significa uma forma de organização económica e politica conhecida como um regime capitalista.
Nenhuma duvida, capitalismo nas relações económicas e social democracia na organização politica.
Mas isso significa valorizar o investimento, o risco empreendedor, a criação de postos de trabalho, valorizar o trabalho por forma a que o que deve ser o objectivo final de cada um, a felicidade, no relativo que neste ponto temos que lhe conceder, não fique impossibilitado e desvirtuado, as pessoas recebam o adequado para viverem com dignidade, alcançarem essa relativa felicidade, a sua e a dos descendentes, se for caso disso, até para garantirem a conservação da espécie, pagarem impostos, contribuirem para o bem comum e para o crescimento e o equilíbrio social, entendido na sua generalidade.
Sei, evidentemente, que conseguir todos estes objectivos é difícil, há tempos e tempos, há os chamados ciclos económicos com picos de prosperidade e épocas menos boas.
Mas vivi assimilando sempre valores que me levaram a valorizar, aplaudir e apontar como exemplo, quem é serio, quem promove investimento quando é produtivo, quem cria emprego e tudo faz para que seja sustentado, firme, duradouro, obtenha lucros, com eles seja mais feliz e com parte deles invista mais, faça crescer as suas empresas e as condições de vida de quem nelas trabalha, aumente a sua riqueza e pague os impostos devidos, por forma a contribuir para o engrandecimento da economia e do bem estar social.
Mas, nos últimos anos, não só em Portugal mas passou-se ao jeito de uma febre, de uma moda que não encontra barreiras para se propagar nem forma para se conter, o que vejo é a sociedade, repito, cá e lá por fora, os media, os fazedores de opinião e que terão o poder para o fazer, dar valor a uma certa espécie de empreendedores, investidores , chairmens, CEOs ou o que lhes queiramos chamar, eles próprios e de seguida todos os que mencionei, darem vivas e notabilizarem pessoas que fazem noticia por obterem cada vez maiores lucros, ao mesmo tempo que fazem despedimentos selváticos, em contra-senso com os lucros obtidos, tornam o emprego absoluta e eternamente precário, fecham fabricas, apesar de rentáveis, lidam com a miséria dos que os ajudaram a atingir patamares de riqueza inimagináveis como se lida com umas peúgas que se mudam ou se rejeitam por nada a não ser porque “não vale a pena”, e podem achar que assim querem. Não há ética, não há espirito de missão, responsabilidade social, não há brio, não há vergonha, é mais isso.
O que dá créditos, nos tempos correntes, é poder dizer que tive mais 30% de acréscimo relativamente ao lucro do ano anterior, que já o fiz com menos postos de trabalho, que vou diminuir mais uns quantos e baixar os ordenados, devido á crise e ás nuvens negras que virão lá do sul…!
Mas vou subir os preços sempre que possa e recorrendo ás ajudas de todo o género que continuo a procurar.
E são esses os premiados, os noticiados, os que ganham prémios de maiores e melhores gestores, andam nas bocas do mundo, senão nos altares. Talvez por ainda termos uma Constituição laica ou plural quanto á crença ou ausência dela.
De maneira que me senti confuso, esta manhã, enquanto fazia a barba.
Mas porque raio não fiz eu a barba, esta manhã, com a maquina fabricada e bem por uma forte multinacional, em vez de me escanhoar com a gilete?
Bom, pode ser apenas do calor excessivo que temos e não é próprio desta época do ano.
Afinal, a pele e os humores são muito sensíveis ao que a toca e ao tempo que faz. Se for só isso, passará em breve.
Se, por acaso, vier a ser coisa de força maior, vou meditar um pouco mais sobre a imagem que hoje obtive e entendo que bem pode ilustrar o que me vai no pensamento.
A todos, façam o favor de tentar ser felizes.
Carlos Pereira Martins
Sem comentários:
Enviar um comentário