Falar bem português é coisa já de museu, rara, de gente estranha, com hábitos muito esquisitos, de fugir a sete pés pois não são mais do que uns "chatos" !
À saída de um qualquer curso, mestrado ou doutoramento na difícil arte de bem palrar e bem escrevinhar na língua de Camões, Pessoa e Saramago, podemos mesmo deparar com um entendido, como dizem os espanhóis, um "esperto", a escrever isto nas redes sociais:
"Olha, ó meu, tenhote oubido bezes sem conta e estou fartinho de te escutar. Estou em acarditar que isto de inscreber no fácebuque ou nos istagramas é uma faca de dois legumes, tanto pode ser oubido assim cumássado. Não bou inscrever máinada pra ti. Prontos! "
Cá por mim, tenho já como experiência de vida, o seguinte:
1 - Encontro inesperadamente um tipo conhecido que logo me diz:
“NÃO ERA SUPOSTO teres ido ao centro comercial esta manhã? “
… e sei que estou, muito provavelmente, a falar com uma pessoa jovem, poderá ter 18, 20, até 40 anos, com habilitações literárias médias ou mesmo na média superior. Que não é dada, mesmo nada, a hábitos de leitura, que se relaciona muito com pessoas daquele mesmo género, que também não gostam mesmo nada de ler mas falam pelos cotovelos e usam amiúde aquela expressão que terão ouvido a alguém visto como um intelectual ou com estatuto de pessoa que fala bem.
2 - Encontro com naturalidade alguém que me diz:
“ ERA EXPECTAVEL que ele tivesse cá vindo ontém “
… e sei que estou a falar com uma pessoa, com grande probabilidade, do sexo feminino, com nivel literário médio ou médio baixo, que poderá ter entre 25 e 50 anos, com boa apresentação, que sabe que é vista com os mesmos olhos de quem olha o milho de boa qualidade.
Que tem um vocabolário muito reduzido mas pensa que aquela e outras expressões do mesmo género compensam a falta de conhecimento de muitas outras expressões e compensam, sobretudo, os anos de notas péssimas a português e a matemática.
Pessoa que tem grande aversão a livros e a leituras que não sejam as revistas de cusquice e mal dizer e que nunca foi ainda mal tratada ou precisa encontrar quem a mal trate muito e muitas mais vezes.
3 - Encontro ou vejo e oiço num televisor uma pessoa que diz :
“QUIÇÁ”
… e sei que se deverá tratar de um comentador desportivo que chama a um jogador francês Má-ti-ô.
Que, pela mesma razão chamaria a Mireille Mathieu, Mireie Má-ti-ô e que abomina leituras que não sejam um dos três jornais desportivos , conforme a queda e a respectiva côr clubistica.
Pessoa que diz e escreve “quaisqueres” e pode ainda brindar-me com ene palavrões desta estirpe.
4 - Entram-me pelos ouvidos expressões tais como:
… “Eu digo a ele”, “dizeria-lhe”, “mete as meias”, “diz a ela”, “mete o pão na mesa, não te demores”, "mete arroz no meu prato" …
… e sei que posso estar a falar com qualquer filho do senhor ou filho da senhora que não teve a sorte de ter nascido na minha geração ou no início dos anos da geração imediatamente seguinte e, portanto, não sabe mesmo articular um verbo reflexivo, um pronome reflexo, uma ponta de uma haste de um boi de português faldo normalmente pelo português habilitado com a quarta classe do ensino primário da minha geração.
5 - Ligo um televisor e está a ser transmitido um serviço informativo :
… ou desligo o televisor logo de seguida, ou fujo a sete pés, ou já me deixei apanhar e devo ser socorrido … ou, na boa hipótese, já levava os ouvidos protegidos e hermeticamente tapados, com tampões como na Formula 1 .