sábado, 15 de julho de 2017

EM MEMÓRIA DE AMERICO AMORIM E DA ESTIMA ENTRE PESSOAS DE BEM



Pelo  muito respeito  que  tive  por  Américo Amorim,  deixei  passar alguns  dias  antes de escrever  uma letra  sobre  o  enorme  pesar  que  sinto  pelo  seu  desaparecimento.


Tive  os  primeiros  contactos  com  Américo   Amorim,  nessa altura,  tratava-o  pelo Senhor  Américo,   nos  anos  80,   na   montagem   de  operações  do  mercado  de capitas  para  as suas empresas   Ipocork  e  Corticeira Amorim.  Visitava-o, então,  em Mozelos,  em Vila da  Feira.


Certo  dia,  num  fim de dia,  pelo  sinal,  perguntou-me  o  que  achava  de  duas das  suas  “ousadias”  de então,  o estreitamento de relações  com  mercados  de leste,  em particular  a União Soviética,  e  a  aproximação,   negocio e  escoamento  da cortiça  do  sector  cooperativo,  em  particular das então  muito  faladas e motivo  de  luta política , as Cooperativas Agrícolas de Produção.


Claro  que  a minha opinião  não  podia deixar de ser positiva,  isento  que estava  de  fundamentalismos  políticos.  Pelo contrário, sempre achei  que  o comercio é  motivo  de paz  e entendimento  pois para realizar  operações comerciais e negócios,  as empresas e as pessoas  terão  forçosamente  que estabelecer pontes entre si,  entre os países, que se entender e  criar clima  de apaziguamento e entendimento.
E ficou comprovado  que a sua visão estratégica foi de génio, os objectivos cumpridos  e  o seu acumular  de ganhos  e criação  de  riqueza  e  distribuição, através  da criação de mais  postos de trabalho,  foi  notável. 


Certo  dia,   para concretizar  uma aproximação  e  possibilidade de compra  de  uma empresa  de bandeira nacional  e histórica no sector vinícola,  sabendo  que  me dava tão bem  com  o  seu  lider,  como  com  ele próprio,  e  tratando-se  de dois , chamemos-lhe  “pesos pesados”    do  tecido  empresarial  nortenho,   pediu-me  se  estaria  disponível  para  realizar  um jantar  em  total  secretismo, não  queriam  ser mesmo  vistos  juntos,  por  quem  quer que fosse.  Apenas  nós os três,  numa  sala  privada  de hotel  no Porto.


As  coisas correram  e o jantar  ficou  marcado  para determinada noite  no Hotel  infante de Sagres, no Porto, sala privadissima,  apenas os três e ,  eu,  apenas com a incumbência  de  colocar  panos quentes  entre os dois,  sempre que de qualquer dos lados,  as coisas  pudessem  rumar  para caminhos  ou  palavras que  viessem  a  impedir  a desejada ponte de bom entendimento.

No porto, nesses dias,  decorria  um qualquer  grande congresso  do sector do  turismo  que  não  me deixara livre um  quarto  em  qualquer dos hotéis  onde  costumava ficar, o meridiano, o Sheraton, ainda na Avenida da Boavista do outro lado  da rua  do Meridien,  ou no Infante de Sagres.

Reservei, então,  no  Solverde, em Espinho,  ficava  muito  perto  e  em caminho  para Lisboa.

Costumo dizer e cumpro,  que  nunca sofri  de   “refluxo”  em  relação  ao  que  os meus amigos  me  diziam  em  privacidade.  Nada sai nem  nunca saiu.


Hoje,  pela primeira vez,  posso acrescentar  ou revelar,  que os intervenientes eram  o Senhor Amorico Amorim,  lider do  já então Grupo Amorim,   e  o Senhor Manuel Silva Reis,  pai, lider da Real Companhia Velha,  uma empresa historia do  Vinho  do Porto,  com  pergaminhos de realeza.


O jantar  e  a  criação  de pontes,  correram  muito bem. Devo acrescentar que  o fiz  por  amizade   e  pelo  apreço  que  cada um deles nutriam  por  mim,  as despesas de deslocação,  estadia, etc,  as minhas,  foram  mesmo minhas, o jantar,  nem  sei  mesmo  quem  o pagou. Um dos  dois, certamente.
Cheguei  a pensar  e  acredito  ainda,  que  gostaria  de ter trabalhado  com  aquele homem,  com  o Senhor amorico amorim. Nunca veio  á conversa e nunca lhe deixei entender, para não me colocar em posição de inferioridade. Mas,  pelas  características dos dois,  o caracter,  creio  que teria dado  muito certo.


E tudo correu  em  tão  bom clima  que deixei  o Porto  rumo a espinho, ao Solverde  com  muito boa disposição e sem sono, mesmo sendo  já  mais da uma da manhã  do  dia seguinte.

Por isso  mesmo, ali chegado,  estacionei  no parque do hotel, evitei  entre o tirar a mala e fazer o check-in  ou  seguir para Lisboa  já que no dia seguinte  teria uma viagem  para o estrangeiro.

Com todas  estas duvidas,   saí  do carro  e fui tomar qualquer coisa ali  ao bar  do  Casino de espinho,  mesmo  ao lado.

Continuava a sentir-me desperto. Entre o ir para o quarto  e despertar cedo  nessa madrugada  ou  seguir caminho, decidi então seguir para Lisboa.

Já  ali  perto  da Mealhada,  senti  sono, o primeiro.  Parei. Pensei  ir dormir  um pouco  a casa  dos meus sogros  que ficava ali  na Malaposta, ao lado de Anadia.
E foi  a mesma luta com as mesmas duvidas. Decidi  ir  para Lisboa.

E o sono, aí talvez já  com  o peso   psicológico  a  funcionar,  foi aumentando. Parei  em  mais  dois  cafés  de estrada,  bebi  duas bicas.

Mas,  ali  perto  do  final da auto estrada,  já próximo de Lisboa,  onde existem  aquelas barreiras sonoras  do lado  direito  no sentido  Porto-Lisboa,  devo ter fechado  os olhos  por  um segundo  ou dois,  senti ramos  no pra brisas sobre o lado direito,  guinei  para a esquerda,  ia   quase para bater no rail  da esquerda,  guinei, voltei a guinar, “contrebracage”,  que aí, na condução, eu era bom,  e saí  daquele embargo sem bater,  sem  um acidente grave.

Cheguei a casa ainda branco,  deitei-me  e perdi  o sono.

Passadas umas semanas, poucas,  li no Diário de Noticias que  uma senhora tinha ali falecido,  por volta  da mesma hora,  semanas depois,  talvez  devido  ás mesmas dificuldades  ou  más decisões que eu tomei naquela noite. Tive sorte. Ou   a minha queda para a condução,  deve ter-me salvo.

Encontrei  Americo Amorim, ao longo da vida,  variadíssimas vezes, por exemplo, no aeroporto de Lisboa esse em saída em férias com a família, ele me explicava que iriam em voos diferentes,  para minorar os riscos. Era muito discreto,  pesava  o risco,  não fazia  a vida dos novos ricos  que  os deslumbrados  pelo êxito, normalmente,  exibem  e fazem.

Daí  que  quando  um dia disse que  não era rico, depois de mais uma publicação que o dava como o português mais rico,  não foi entendido.  Sabia  o que tinha mas não vivia “á rica”, nem  exibia  esse estatuto  ou essa postura obscena .


Agora  que  o “Senhor Américo”  nos deixou,  fica  o meu testemunho  como  ia  morrendo  … por  simples amizade e estima.  Ainda havia  “jovens”  assim ,  naifes,  chamar-me-ão,  no final dos anos 80.
  







Sem comentários:

Enviar um comentário