Acabar com
a paranoia que nos meteram na cabeça, a primeira receita
para acabar com a crise em que todos vivemos !
Move-me
um propósito construtivo, de ajudar, dentro
do possível, a encontrar soluções, para
acabar ou minorar a gravíssima crise com que nos
confrontamos e que ameaça muito seriamente alargar-se a todos
os Estados Membros da UE , que mina os alicerces e
princípios fundadores do projeto Europeu, o modelo social
europeu e as próprias democracias.
Antes
de mais, porque de matérias de natureza económica se trata,
convirá ter presente que a economia é uma ciência social, não
uma ciência exata.
Significa
isto que qualquer fenómeno económico, qualquer factor que seja
mexido, qualquer alteração numa política tem repercussões em
variadíssimos outros factores e aspectos da realidade económica
no seu todo.
Significa
também que não dou crédito, por regra, a quem sobre matérias
económicas tem verdades adquiridas e age ou comunica como se de
ciências exatas se tratasse.
A
história muito recente do País mostra isso com toda a clareza.
Tudo tem implicações em quase tudo e quando se opta por atuar
com um determinado instrumento, os impostos, o fator mão
de obra, salários, emprego, consumo, etc, surgem
comportamentos muitas vezes tidos por inesperados
ou surpreendentes exatamente porque não foi tido em conta que
se trata de uma ciência social.
Tenho,
de facto, as maiores reservas em relação a quem apresenta
opiniões em matéria económica como se de atos de fé se
tratasse ou de verdades inquestionáveis.
Como economista,
Membro do Comité Económico e Social Europeu, Conselheiro do
Conselho Económico e Social português, tenho acesso a
vasta informação que não posso deixar de ter presente e dela
fazer uso para o bem comum, para
a causa e defesa do interesse público.
Como
economista, considero, com fundamentos técnicos, que há
um erro na formulação de prioridades recentemente anunciadas
no sentido de superar as dificuldades atuais da economia
portuguesa e lograr relançar o país no sentido do crescimento
e do equilíbrio das contas nacionais.
Não
creio que devam manter-se expectativas tão elevadas
nas Exportações
, como
os responsáveis governamentais pelas politicas
económicas recentemente anunciaram .
É
verdade que existem, presentemente, novos destinos de exportação
para os bens e serviços produzidos em Portugal mas, o seu peso
no conjunto das exportações portuguesas não tem ainda o
significado que se pretenderia. Os principais mercados de
destino das nossas exportações estão, também eles, em
grande queda e com perspetivas muito pouco animadoras já para
o muito curto prazo.
Espanha
é , por tradição e por razões geográficas, o nosso mercado
natural e tudo indica que muito proximamente não venha a
registar melhorias significativas em relação ás quebras
que já hoje se observam.
Os
restantes mercados do centro da Europa e mesmo da chamada europa
de leste e os periféricos, acompanham esta tendência.
O
próprio Brasil, terá, a meu ver, tempos difíceis a não
muito longo prazo já que todos os indicadores confirmam a
existência de uma bolha imobiliária e de concentração de
risco e elevada alavancagem do sistema financeiro que
nos deve levar a estar atentos.
Infelizmente.
A
forma de melhor contribuir para o relançamento da economia
portuguesa e para minorar a elevadíssima taxa de desemprego
susceptivel de minar seriamente a estabilidade social e a
própria democracia, passa pela dinamização
e estímulos ao Mercado Interno orientada para a substituição de
importações.
Por
esta via, não só se conseguirá dinamizar a procura interna, o
consumo, principal factor para manter em atividade e dinamizar
as empresas e o tecido industrial e comercial, bem como para
parar com o ciclo assustador de falências e destruição
de emprego, e lançar as bases para a efetiva criação de
novos e mais empregos.
Por
essa Europa fora e um pouco por todo o mundo foi muito
irresponsavelmente alimentada uma
paranoia de cortar em tudo,
parar com o consumo, poupar sempre mas , medo em gastar fosse
no supérfluo fosse no essencial.
A
conjuntura ajudou muito na propagação dessa paranoia
irresponsável pois muito boa gente que para isso contribuiu e
contribui ainda, tem toda a obrigação de saber e calcular os
efeitos devastadores do que está a semear.
É
verdade que as Pessoas, as Famílias, as Empresas e os Países
se viram confrontados com a falta de fundos, com a escassez de
meios e com o peso demolidor das dívidas acumuladas.
Neste
quadro, é inegável que é necessário fazer esforços de
continência nos gastos, sobretudo no que é supérfluo, no que
é faustoso e desnecessário, sobretudo no que possa
ter origem no Estado, as despesas públicas.
No
que seja privado, se legitimo, o consumo deve ser até bem
vindo, não deve ser perseguido.
Daí
que um discurso de prudência e de apelo á continência de
gastos de quem tem responsabilidades pela condução das
políticas , fosse aconselhável e justificado. Mas, a receita
aplicada de tudo cortar, de levar tudo e todos a entrar na paranoia
de parar com o consumo, fosse ele de que natureza fosse, sendo
as pessoas levadas a fazer isso mesmo já que os seus rendimentos
lhes vão sendo dia a dia subtraídos ou abusivamente retirados,
caso das pensões de reforma que são reservas constituídas
pelos próprios , retiradas aos seus ordenados ao longo
de uma vida de trabalho, demonstrou-se uma
medida devastadora e corrosiva do tecido social e dos
próprios regimes democráticos. Demonstrou-se com
toda a evidência, não é uma questão de crença, de ideologia
ou de fé, está comprovada pelos factos.
É
possível e legitimo que cada um possa e deva fazer contenção.
É até recomendável. As leis dos grandes números
encarregar-se-ão dos equilíbrios necessários para que a vida
não pare e a espécie se conserve.
Não
é possível é que TODOS parem de consumir ou de produzir ao
mesmo tempo. Nessas circunstâncias é o fim anunciado e
realizado.
Volto
á minha primeira questão, é tecnicamente
incorrecto colocar todas as prioridades e expectativas nas
Exportações bem como no aumento da carga fiscal. A
recente comunicação do Executivo, Ministro das Finanças,
lançando as linhas básicas das medidas para o Orçamento
de Estado para 2013, elegem as Exportações e o IRS como as
ferramentas essenciais. E, a meu ver, está tecnicamente errado.
É
dos compêndios de economia que os limites superiores de
incidência fiscal, de agravamento de impostos, conduzem a uma
maior fuga e evasão fiscal, á domiciliação de rendimentos
fora do País , ao aumento da economia paralela , dita informal
ou negra, á fuga de capitais.
De
tudo isto temos já exemplos claros. E muitos.
Como
economista, partilho da opinião que ao invés de se procurar
colocar como objectivo
prioritário a redução dos défices, externo e orçamental, o
rumo a traçar e os objetivos a prosseguir deverão ser o
crescimento e a redução dos níveis de desemprego.
É
um erro colocar tudo e todos a “trabalhar para os défices” até
pelo simples facto de que os défices, em percentagem do PIB, o
Produto Interno Bruto, como é usual medir-se, aumentam por
si só, mesmo sem que o endividamento aumente, mesmo
que não haja recurso a novos compromissos com os credores,
apenas pelo facto de o PIB estar a diminuir, a decrescer.
Assim,
é evidente que continuar a aplicar cortes sobre cortes nos
rendimentos, nos salários e nas pensões, leva á
paralisação do consumo, a mais falências de empresas, a mais
desemprego, em suma, a menos produção de riqueza.
Logo,
diminuindo o PIB e mantendo-se embora o endividamento já
existente, é claro que a relação entre a divida e o Produto
aumenta, logo, estamos a agravar o endividamento.
Não há receitas milagrosas para enfrentar uma crise europeia e mundial até pelo facto de os efeitos das medidas se replicarem por vezes com consequências contraditórias.
O que por agora interessará ter presente é que, como cada vez mais entidades insuspeitas reafirmam, incluindo o FMI, BCE e CE, é que, esta receita de mais austeridade e perda de rendimentos piora a situação do País, leva á desagregação social. Leva á paralisação do Estado e da Economia e pode levar a cenários de perda de PAZ que há décadas nos empenhamos em arredar.
A
questão tem a ver com Coragem.
Coragem
para tomar opções num contexto de crise grave, do País e de
quase todos os Estados europeus e mesmo de outros continentes.
Coragem
para eleger outros objectivos e metas que não sejam a
austeridade que, está provado, não leva a nada mais que não
seja ao agravamento do mal que está estava instalado.
Em muitos
Estados membros europeus o despoletar da crise, por sinal,
financeira, no inicio e com origem do outro lado do
Atlântico, foi aproveitado por quem estava na oposição aos
poderes constituídos, para promover a alternância, para
conquistar o poder pelo poder, não pensando ou prevendo
as consequências que daí adviriam.
Em
Portugal não andamos longe disso, as culpas do estado da
economia e dos problemas foram simplisticamente colocados em
quem estava no poder isolando as responsabilidades da crise
europeia e mundial que estava presente.
Há
um argumento forte tido por incontestável que é frequentemente
utilizado: “mas não havia dinheiro para pagar mais nada nos
próximos meses, nem pensões nem aos funcionários públicos
nem aos fornecedores do Estado”.
Mas
isto foi e é o argumento para convencer o elitorado, para
ganhar votos e o poder.
Não
pode ser ignorado o facto de o risco associado ao Estado
português, devido ao excessivo grau de endividamento, ter
chegado a colocar em causa a solvabilidade do próprio
Estado.
É
evidente que se chegou a uma situação de quase colapso mas é
também evidente que outros estiveram ou estão ainda na mesma
situação, e outros aí virão muito proximamente, e alguns
deles renunciaram á via simplista de submissão aos predadores
dos mercados de divida pública e encontraram vias
alternativas sem ter que liquidar a classe média, sem ter que
destruir o tecido produtivo e o comércio, sem ter que colocar
milhões de cidadãos no desemprego.
Não
creio que o problema de Portugal seja um problema de
elites. As elites são necessárias e imprescindíveis na exacta
medida do aproveitamento das suas escorreitas capacidades e
liderança no sentido do crescimento, da criação de valor para
a Sociedade, das suas capacidades e conhecimentos.
O
problema português e de muitos outros países é a
condescendência com certas práticas elitistas e não apenas
das elites que se configuram fraudulentas, que promovem
e objectivamente facilitam a corrupção, factor
fundamental para o estado a que tudo isto chegou. E,
nas condições atuais, em nome da crise, com terreno fértil
para proliferar. Vejam-se alguns casos recentes ou anunciados,
por exemplo a venda paga de um Banco a interesses estrangeiros,
promovida por leites nacionais vendidas a esses interesses.
Tal
como noutros países, agora e em tempos e depressões
passadas, há um fenómeno que valerá a pena aqui referir
pelo impacto social que tem e pelo efeito destruidor na vida das
Famílias e no tecido social.
Refiro-me
ao elevado grau de incumprimento e mesmo de impossibilidade
de um número muito significativo de famílias não poder honrar
os compromissos assumidos pelos créditos á habitação,
créditos hipotecários, contraídos nos tempos de
pretenso desafogo, ou de normalidade.
Penso
que este problema, gravíssimo quer para os devedores que
consigo arrastam para situações de desespero pelo menos os
familiares mais próximos,
quer
para os credores, a Banca e o sistema financeiro em geral, só
tem solução com uma elevada dose de coragem política.
Há
mesmo alguns economistas como o prémio nobel Paul Krugman
ou Stiglitz que a este fenómeno se referem sugerindo a tal dose
de coragem política que possibilite uma real redução e
perdão parcial das dividas contraídas e o alongamento
dos prazos de amortização.
De
facto, contra um risco real e iminente de estrangulamento
social, sem solução possível pelos métodos
convencionais das execuções judiciais e entrega
dos imóveis aos Bancos, o perdão parcial de divida e a criação
de condições para que se retomem os pagamentos e se evite
o colapso geral, é uma solução aceitável.
Coragem,
e muita, é necessária para quem governe e lidere essas
politicas já que contará, por certo, com um coro de
criticas e de agitação por parte dos sectores mais conservadores ou
politicamente oportunistas, baseados na critica fácil que se
estará a favorecer quem é relapso, quem não honra os
seus compromissos, finalmente, quem vive á custa dos outros.
De
qualquer forma, parece-me ser a solução possível e os
governantes que ficarão na história são os que, em momentos
difíceis, mostrem ser corajosos quanto baste.
E terminarei recordando
o que escrevi já logo no inicio :
“porque
de matérias de natureza económica se trata, convirá ter
presente que a economia é uma ciência social, não uma ciência
exata."
Quase
todas as críticas feitas aos responsáveis políticos em
matéria económica, sejam governantes, oposição ou ao próprio
Senhor Presidente da República, repito, em matéria
económica ,pois da matéria política não me quero
ocupar,
Não são sustentadas
em termos científicos. Carecem quase todas de fundamentação
base científica para que possam ser levadas a sério.
Acontece
é que aparecem pela boca de comentadores políticos, figuras
muito conhecidas da opinião pública e que , por isso, são
escutadas e muitas vezes levadas a sério e mesmo aplaudidas.
Verdades
absolutas, criticas irrefutáveis numa lógica de raciocínio
matemático, em matérias económicas não são sérias pois se
não levam em conta a natureza dos fenómenos económicos, as
implicações em quase todas as outras variáveis, não são
sérias, não terão valor científico como se tem vindo a
comprovar.
Outra
coisa será as pessoas gostarem de as ouvir, vindas de
pessoas com reputados conhecimentos que não estão ao
alcance de todos.
Outra
coisa ainda será as pessoas escutarem, concordarem e até
rirem com essas criticas disparadas com alça certeira e afiada.
Mas
há que compreender que de uma boa piada e de uma alfinetada bem
dirigida, quase toda a gente gosta, sobretudo em
períodos de maior melancolia, de dias cinzentos e se o
horizonte se anuncia ainda mais tenebroso.
Mas,
aí, esses comentadores, não estarão a comentar a sério.
Estarão, quando muito, a fazer, conscientemente, palhaçadas.
Está muito em moda referir, a torto e a direito, os Economistas como pessoas que apenas fazem previsões no fim dos acontecimentos consumados. palavras ocas, irresponsáveis mas que fazem rir, claro.
Estarão
a usar o tempo que através das televisões ou da comunicaçãoo
social em geral lhes estamos a pagar, contribuindo, aí sim,
para o uso dos nossos impostos em proveito próprio para fazer
palhaçadas ou jogos de acesso ao poder.
E
há que distinguir, sobretudo quando o dinheiro é mais
escasso, se queremos palhaços ou técnicos, gente de
ciência ou bobos.